Linha do Tua

«Pare, Escute, Olhe»

Pare, Escutem e Olhem a Linha do Tua

Com texto de Jorge Laiginhas e fotos de Leonel de Castro, «Pare, Escute, Olhe», editado pela Civilização, é um grito de revolta perante o fechar de olhos do(s) Governo(s) em relação a Linha do Tua. Os dois autores acreditam que há vida para além da possível Barragem Hidroeléctrica de Foz-Tua e não compreendem a cegueira dos governantes perante uma região, Trás-os-Montes, que tem todas as capacidades paisagísticas para ser um pólo de turismo nacional e internacional.

Com o olhar a preto e branco Leonel de Castro escondeu toda a riqueza de cores da Linha do Tua. Uma atitude consciente porque o objectivo desde o início deste trabalho conjunto foi transmitir «uma marca nostálgica», mas também de incompreensão. Ao longo das páginas de «Pare, Escute, Olhe» temos a oportunidade de verificar a angústia de um povo, que não compreende os motivos do abandono que é submetido todos os dias, meses, anos, décadas… A obra termina com uma carta dirigida a José Sócrates, uma carta de uma região que pede apenas um simples olhar, um olhar que nuca faltou a Jorge Laiginhas e Leonel de Castro, responsável pelas respostas abaixo.

Como surgiu a ideia deste trabalho entre ambos?
Quando nos conhecemos o tema veio logo à baila. Falei com o Jorge Laiginhas que estava a fotografar a linha e ele imediatamente disse que também gostaria de fazer algo. Juntámos portanto o útil ao agradável e fomos os dois para o terreno. E assim surgiu a nossa criança, sem qualquer apoio, com muito esforço, vontade e muito, muito gozo.

Porque as fotos a preto e branco, quando uma das forças da Linha do Tua é precisamente as suas cores?
Acho que o monocromático se ajustava mais ao tema. No entanto é um suporte que me agrada bastante no tipo de trabalho individuais que costumo desenvolver. É verdade que toda aquela paisagem tem uma gama muito grande de cores, mas para se ganhar num lado tem de se perder em outro. Acredito que o preto e branco casou muito bem com o tema que desenvolvemos.

Há no livro um claro ar melancólico, nostálgico. Isso aconteceu ao longo do trabalho ou foi algo pensado desde o início?
Desde o início que deixámos essa marca nostálgica patente no trabalho. Porque transmite o espírito de abandono do povo transmontano.

Quem utilizava a Linha do Tua? Quem eram na realidade os seus passageiros?
Os grandes frequentadores da linha eram os habitantes de Ribeirinha, Vilarinho das furnas, Abreiro, Vieiro, Cachão e Frechas. No entanto, se o governo estivesse interessado em manter a linha, criava um plano turístico para a região. É assim que se faz nos países civilizados. O governo fechou a linha porque não lhe trazia lucro. Mas o metro de Lisboa também dá prejuízo e ainda não fechou! Os transmontanos não pagam os mesmos impostos que os habitantes do Terreiro do Paço?

Apesar dos acidentes e da proximidade da morte, a verdade é que a Linha do Tua era uma espécie de grito de revolta de uma região. No entanto, esse grito nunca foi ouvido…

Os acidentes só existiam porque nunca houve investimento na linha para os evitar. A manutenção já não era feita há algum tempo, ou melhor, não se fazia com tanta frequência. Aliás, ainda podemos ver as travessas podres que se encontram lá. Depois, a máquina que circulava na linha também não era a apropriada para aquele trajecto.

Devem ter tido contacto com os maquinistas da Linha do Tua. O que eles falavam? Quais eram os seus medos, preocupações e angústias?
Todos os maquinistas adoravam a linha. Era ali que ganhavam o pão para as suas famílias. Relativamente aos seus medos, não sei responder... Mas as suas preocupações e grandes angústias é ficarem sem emprego e deixarem de terem o pão para levarem para casa!

Qual a sua posição em relação a Linha do Tua?
Eu sou contra a barragem. Defendo a linha porque faz parte da identidade de Trás-os-Montes e seria importante criar um plano turístico para o local. O comboio é um transporte útil e necessário para muito gente que ainda lá vive. Defendo a preservação do vale e da natureza. A barragem não vai trazer benefício para a região, vai alterar o clima e prejudicar a agricultura, além de destruir uma paisagem que é património mundial.

Acredita que não ter acontecido um desastre maior ao longo dos anos foi um milagre?
Não. A linha tem 120 anos. Não deve ter tantos registos de acidentes e de mortes ao longo destes anos como tem o IP4 só durante um ano.

Por fim, o primeiro-ministro vai ler a carta que escreveram para ele?
Acredito que sim mas não a vai levar a peito!


Pedro Alves in DD, 2010-03-24

Comentários

José A Pinto disse…
Muita falta de visão estratégica e, fundamentalmente, muita falta de autonomia regional para poderem escolher, localmente, quais as melhores opções de desenvolvimento. O futuro de uma região fica assim irremediavelmente comprometido pela decisão de alguns senhores lá longe em Lisboa.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

A situação a que chegou o sistema ferroviário do nosso País é, no mínimo trágica; assim como trágico é o início do que alguns consideram a alteração estratégica fundamental de tal sistema para fazer chegar até nós a modernidade através da integração no sistema ferroviário europeu.
Para além do enorme atraso temporal a desproporção do investimento face a decisões de razoabilidade, mais capazes de converter o sistema feroviário nacional na satisfação inequóvica do interesse nacional das populações do seu território do que como ponto de passagem de uma ruinosa política de transporte e não de fixação.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (semper com ponto final)

PS - Imaginem agora a CP e a REFER dividida em 7 empresas regionais para operarem a exploração das diferentes subredes ferroviárias dentro do território nacional, em vez de estar a ser dirigida centralizadamente por alguém em Santa Apolónia ou onde for com desconhecimento geográfico de causa.