O efeito "difusor"

|Rogério Gomes - Semanário Grande Porto|


O desvio para Lisboa de verbas provenientes da União Europeia destinadas ao desenvolvimento das regiões, no âmbito do QREN, com o argumento de que se destinam a projectos “difusores” de progresso por todo o território nacional esteve em discussão no Fórum da rádio TSF.

Aparentemente, nada mais democrático do que abrir a antena à polémica pública; na verdade, transformou-se numa completa mistificação do problema, com o argumento dezenas de vezes repetido pela jornalista de serviço de que era matéria considerada “legal” e como tal sancionada pela Comissão Europeia – notícia antecipada pela rádio lisboeta sem citar fonte e, portanto, legitimando especulações sobre a quem interessou o 'timing' de tal divulgação (ao Governo, naturalmente).

A questão da legalidade é, de facto, absolutamente risível. Tendo o Estado português, por iniciativa governamental aprovado legislação destinada a suportar a opção política de levar dinheiro que seria devido às regiões para Lisboa, é absolutamente lógico que a Comissão Europeia diga que a acção é “legal”…

É até ridículo fazer disto notícia de abertura de noticiários como fez repetidamente a TSF. Se fosse ao contrário, é que seria de estranhar e, como tal, notícia de destaque. Pior ainda: nunca a questão política foi suscitada pela rádio, que conseguiu que um ex-secretário de Estado estivesse cerca de 20 minutos em antena a tentar justificar aquilo que é uma completa distorção do que deveriam ser os princípios orientadores do QREN.

É verdade que a Comissão Europeia foi chamada ao assunto da legalidade pela Junta Metropolitana do Porto, que em simultâneo remeteu o assunto para os tribunais comunitários, com argumentos que vão muito para além da observação jurídica pura e simples. E, no fórum, Rui Rio, como presidente da AMP, explicou isto mesmo.

O cerne desta questão, aquela que não foi discutida, é mesmo a opção política que suporta este desvio.

Para melhor percebermos, vamos a exemplos dos tais projectos “difusores” em que foram gastos alguns milhões retirados às regiões: melhoria da sede nacional da PJ, formação destinada a funcionários públicos (em Lisboa), apoio a projectos de investigação (em Lisboa), reequipamento da Direcção Geral de Impostos…

Ou seja: o apoio que em princípio era destinado a projectos de desenvolvimento regional, com o objectivo de diminuir o fosso entre a capital e o resto do território foi utilizado para melhorar e reforçar do Estado central…

Com o argumento de que isto é que melhor para o resto do País! Não há de facto maior cegueira política. E também não há melhor argumento contra o centralismo do que observar e denunciar os factos.
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