"Somos o país da malta de Lisboa"

Organizador do Festival de Paredes de Coura lamenta centralismo crescente

Desinteresse empresarial português contrasta com a maior vontade dos espanhóis na associação ao evento


|SÉRGIO ALMEIDA - JN|

João Carvalho, organizador do Festival Paredes de Coura, recorda-se ainda, com uma exactidão quase fotográfica, do primeiro ano em que, ao lado de uma numerosa equipa de voluntários sem experiência organizativa nenhuma, colocou de pé o festival.

O orçamento de 900 euros representou uma parcela ínfima dos gastos actuais, que rondam os dois milhões, mas foi o suficiente para incutir um gosto que nunca mais o largou.

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Os indicadores não enganam: em média, nos quatro dias do festival, as caixas de multibanco registam um movimento superior a dois milhões e meio de euros. Mas o impacto não se resume a esses dias, já que muitos dos frequentadores regressam a Coura noutras alturas, com destaque para a passagem de ano.

Espanha cada vez mais perto

Se a Ritmos, nome da empresa que gere o festival, nada tem a apontar ao empenho autárquico e da própria comunidade, menos pacífico tem sido o relacionamento com o tecido empresarial e as entidades turísticas.

Pelo segundo ano consecutivo, o festival não vai ter um patrocinador principal, lacuna essa para a qual João Carvalho encontra uma explicação: "Qualquer director de marketing afirma gostar de Paredes de Coura, mas, quando chega a altura de patrocinar, fica-se por Lisboa. No fundo, somos cada vez mais o país da malta de Lisboa", lamenta.

Idêntico afastamento tem norteado o comportamento das entidades turísticas lusitanas. Na edição deste ano, o Turismo da Corunha vai ter um pavilhão próprio, mas Portugal, pelo contrário, não estará representado, desaproveitando, assim, uma montra de visibilidade inquestionável. "Os nossos responsáveis turísticos ainda não se aperceberam das potencialidades do festival", critica.

O desinvestimento nacional só não assume proporções ainda mais gravosas para o festival, porque a organização há muito que descobriu em Espanha um parceiro estratégico. Além de representarem já 40% das entradas, os espanhóis - não apenas galegos, mas também madrilenos, catalães e valencianos - têm também manifestado o apreço por Paredes de(l) Coura de outras maneiras. A Rádio Nacional de Espanha, por exemplo, vai transmitir este ano cinco horas diárias dos espectáculos, depois de, em 2009, ter difundido três horas todos os dias.

Por muito gritante que seja essa inversão de papéis, Paredes de Coura prepara-se novamente para receber, entre 28 e 31 de Julho, mais uma edição do festival que, ao longo dos tempos, mereceu elogios unânimes de gente como Dave Grohl (Foo Fighters), Josh Homme (Queens of the Stone Age) e Trent Reznor (Nine Inch Nails).

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Comentários

ravara disse…
O sr que escreve este texto parece ser um defensor da Regionalização em Portugal, tudo bem, eu também sou a favor, porque acredito que este modelo centralizador está esgotado, está morto e deve ser enterrado. Contudo neste texto, noto aqui uma contradição preocupante; é que vizinhança é com a Galiza, uma Região Ibérica, mas em vez dela é referido Espanha. Até parece que estamos perante alguém que defende para Portugal a Regionalização e para Espanha o Centralismo.
Rui Farinas disse…
Depois admirem-se se daqui a algum tempo, com ou sem regionalização, Portugal for uma região espanhola, se não política, pelo menos económica. Já faltou mais!
Mais um exemplo daquilo que é cada vez mais notório: o centralismo corrói a unidade nacional.

O mais estranho é ainda haver quem ainda diga o contrário, e, num discurso bafiento e completamente irrealista, venha dizer que os regionalistas querem "cortar Portugal em pedaços"!

Era bom que essas pessoas, que também por aqui circulam, tecessem alguns comentários a esta e outras notícias. A factos concretos, a provas em como o centralismo está a dar cabo do nosso País.

Fica aqui o desafio.