Centralismo em 2010: um balanço

O fim de ano é sempre tempo de balanço. Por isso, estando nós num país centralista, e tendo sido 2010 um ano em tal se viu muitas vezes e de muitas formas, importa rever as medidas centralistas que nos afectaram a todos este ano.

2010 começou logo mal, com o anúncio do PIDDAC. Uma boa parte dos concelhos nada recebeu, e muitos outros receberam verbas anedóticas. Mais uma vez, o interior do país saiu prejudicado, e sentiu-se cada vez mais esquecido.

Mas isto foi apenas o prenúncio do que aí viria. Num ataque puramente centralista, o Poder Central decide unilateralmente avançar com as portagens nas SCUT de Entre-Douro e Minho e da Beira Litoral, pouco ou nada ligando às opiniões dos autarcas dos concelhos afectados, aos estudos efectuados, ao que tinha sido prometido, à falta de alternativas, aos protestos dos utentes, às dificuldades no pagamento, às consequências económicas e sociais de tal medida… Em vez disso, e perante as queixas de discriminação por parte dos afectados, o Poder Central faz ainda pior, e decide alargar as portagens ao interior do país, aumentando ainda mais os custos da interioridade.

O interior voltou a ser o principal afectado quando de Lisboa chegaram ordens para encerrar mais escolas mesmo em cima do início do ano lectivo, quase sempre contra a vontade dos cidadãos, muitas vezes sem ouvir as autarquias e com decisões tomadas à pressa, sem qualquer planeamento. Pudera: quem decide está longe, e não conhece a realidade em que está a mexer! As consequências do despovoamento, e deste tratamento desleixado para com as regiões rurais saltaram à vista, mais uma vez, este Verão, quando o terrível flagelo dos incêndios saltou para as capas dos jornais, pondo a nu as fragilidades de um mundo rural abandonado e esquecido pelo poder, que está tão longe!

Mas nem só o interior foi afectado quando, já no fim do ano, foram anunciados cortes na CP, com supressão de serviços de passageiros em várias linhas, redução na oferta noutras e cancelamento das obras nas que estavam à espera delas. Tudo decidido nos gabinetes da capital, sem dar satisfações a ninguém, chegando-se ao cúmulo de os responsáveis da CP nem se dignarem a atender o telefone aos autarcas que queriam ao menos saber o que se passava! Enquanto isto, o TGV foi suspenso… Todo? Não! A linha Lisboa-Madrid segue «a todo o vapor».

Também neste sector, e por esta altura, se abriu outro folhetim, com a proposta de centralização da gestão dos portos numa única entidade, que suscitou prontas reacções de quem teme que se pare o crescimento da actividade portuária, principalmente em Leixões, Sines e Aveiro, que só existe devido a uma gestão local, com conhecimento de causa.

O sector aeroportuário também não escapou ao fervor centralista, com a insistência governamental na privatização em bloco da ANA, impedindo a gestão autónoma dos aeroportos, conduzindo a uma previsível subalternização de todos os aeroportos nacionais perante a «prioridade» que é o novo aeroporto de Lisboa.

Centralização foi também a palavra de ordem na cultura, com o final do ano marcado pela proposta de colocar o Teatro Nacional de São João, no Porto, a ser gerido a partir de Lisboa. Os protestos fizeram-se ouvir, contra a delapidação de um dos poucos valores culturais do País situado fora da capital.

Mas o centralismo fez-se também sentir em Coimbra, e aqui em proporções escandalosas. A suspensão dos projectos da estação ferroviária e do Metro Mondego depois da destruição (para obras, supostamente) da Linha da Lousã, o adiamento da auto-estrada para Viseu, o ultimato do Poder Central para que a circular urbana passe onde ele quer e não onde a cidade precisa, e o bizarro caso de um hospital pediátrico novo à espera de ordens da capital para abrir que nunca mais chegam, fizeram o Presidente da Câmara perder a paciência e bater com a porta.

Enquanto isso, 2010 foi o ano de mais uma Cimeira de Lisboa, desta vez da NATO: parece que em Portugal, cimeiras, só na capital. Também assistimos à Candidatura Ibérica à organização do Mundial de futebol, que queria mostrar ao Mundo um Portugal só com duas cidades- «o resto é paisagem». Nem a FIFA achou lá muito lógico, e recusou.

Em suma, todos temos razões para estar cada vez mais indignados com a gestão centralista de Portugal. A necessidade de uma efectiva descentralização é cada vez maior. Em 2011, cabe-nos a todos lutar para que a Regionalização avance. Só assim acabaremos com isto!


João Marques Ribeiro

in Tribuna Pacense (Paços de Ferreira, Entre-Douro e Minho), 31/12/2010

Comentários

Anónimo disse…
Faltou referir a suspensão dos ICs da Serra da Estrela
Al Cardoso disse…
Caro Senhor Ribeiro:

Assino por baixo com a sua permissao!

Al Cardoso