Congresso e Regionalização

Ascenso Simões
Ex-Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas

Ao contrário do que se previa, a Regionalização não foi tema de conversa no Congresso do PS. Apesar de Eduardo Cabrita ter elaborado e apresentado, uma contida e interessante proposta sobre o tema, todos se resguardaram, porque o momento é de urgência.

Para que fique na memória, transcrevo o meu artigo sobre o tema, publicado no Expresso, em meados do ano passado.
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Regionalização – O debate extemporâneo

Sem que se encontre uma razão substantiva para tal, o debate sobre a criação das regiões regressou. Não nos admira que os principais protagonistas, de algumas estruturas desconcentradas da Administração Pública, não encontrem outra narrativa que não seja a abordagem estafada que, desde a década de 70 do século passado, vêm replicando. Mas o que mais nos inquieta é a junção ao coro, de políticos conhecedores, mas não conhecidos por serem imponderados na agregação a ocasionais movimentos “de moda”.

A regionalização continua na Constituição da República Portuguesa, como também lá estão outras proclamações que tardam em ser levadas a cabo. E o caminho que a “lei mãe” nos propõe, para concretizarmos o nascimento de novas estruturas políticas, de âmbito supra-municipal, mostra-se errado, nos dias em que vivemos.

Para que se cumpra o objectivo de se criarem regiões no território continental, impõe a CRP, que se faça, previamente, um referendo nacional sobre dois aspectos essenciais: sobre a vontade de se fazerem nascer essas mesmas regiões e sobre quantas e que área territorial devem comportar. E esse caminho está longe de ser luminoso.

Ao mesmo tempo, outro debate terá que ser feito, o que se prende com as atribuições e competências que estas novas entidades comportarão, e como estas se articularão com o positivo crescimento institucional das autarquias municipais e com o inexistente, mas urgente, peso das áreas metropolitanas. A este mesmo debate, não deixará de se somar um outro, o que está directamente ligado ao peso, na despesa do Estado, das estruturas políticas e administrativas nascentes.

Num tempo de grave crise económica e financeira, em que o país tem que fazer um esforço conjunto para que possa regressar ao crescimento e às contas públicas saudáveis, será difícil encontrar um agregado de razões plausíveis e urgentes, para se justificar o regresso ao debate. É claro que a Região Norte, em especial a Área Metropolitana do Porto, vive situações dramáticas. Com taxas de desemprego superiores às médias nacionais, com um progressivo grupo de cidadãos dependentes dos apoios sociais e com quase ausência de investimento, o mais fácil é voltar a reinventar a roda, e regressar á velha forma de debater a regionalização.

O problema do Norte é a perda de uma voz agregadora, de empresários fortes, de elites que pensem e sejam autónomas. E a prova de que se pode dar um novo impulso, mesmo sem regionalização, está na realidade vivida pelo Porto e pela sua capacidade de liderança, durante quase toda a década de 90 do século passado.

Perante tudo isto, deve o país deixar de pensar sobre a existência de estruturas políticas de âmbito supra-municipal? Claro que não! Mas deve voltar a estudar, deve mobilizar os agentes locais para o debate nacional, deve ponderar a simultaneidade da criação das regiões e a formatação igualitária das suas competências. Deve, em suma, fazer o trabalho de casa que, por vezes, o folclore faz esquecer. E voltar ao debate quando a urgência da crise não for o que mais aperta as famílias portuguesas.
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