Deficit da Madeira ajuda a enterrar a regionalização

O fim do jardim de Jardim

Perante notícias que davam conta do provável fim da zona franca da Madeira, de benefício desconhecido para o país, Alberto João Jardim ameaçou com a independência do arquipélago. O separatismo é assim o último argumento do velho senhor da Madeira, em vésperas de eleições e a braços com a bancarrota da região, cujos contornos vêm sendo conhecidos desde que a troika começou a pedir contas mais detalhadas.

Em rigor, a referência à independência é um passo doble de Jardim, que tenta chantagear o Governo da República e, também, congregar apoio dos eleitores, numa região em que tudo parece depender do seu governo, e das suas boas vontades.

É claro que na região há muita gente que, de forma discreta, ou mesmo secretamente, detesta o autoritarismo instalado, odeia a nomenclatura que controla os negócios e o despesismo sem tino e se envergonha com o tom e o teor dos discursos de Jardim. Há muitos outros que viveram anos e anos à custa da economia artificial, que têm emprego garantido no gigantesco sector público da região, e que sabem ou pressentem que, doravante, nada será igual.

O problema é que como a região está falida, nem uns nem outros vêem que haja uma alternativa, e muitos ainda acreditam que Jardim conseguirá, com o seu discurso ingrato, atemorizar o Governo dos cubanos e manter em silêncio o Sr. Silva, que sobre a Madeira não tem opinião. Por essa razão, Alberto João é visto como o vencedor antecipado das eleições regionais, ainda que se admita que possa perder votos.

Mas essa vitória anunciada pouco ou nada resolverá. Os súbditos continentais de Jardim, porque é isso que somos neste sistema colonial invertido construído após o 25 de Abril, em que os insulares foram poupados a pagar a sua parcela nos custos de soberania, não podem continuar a sustentar esta situação e a saldar as dívidas que se continuam a acumular em ambas as regiões autónomas. Por isso, espero que o Governo não se atemorize nem ceda a pressões. Espero que se limite a cumprir as obrigações constitucionais que são mais do que suficientes em termos de solidariedade territorial e que não hesite em reduzir o custo das empresas públicas.

Se Carlos César não quer fazer ajustamentos nos salários da Função Pública e quer ter empresas regionais inviáveis e inúteis, deve pagar a factura à custa dos seus eleitores.

Se Alberto João não tem dinheiro para pagar aos fornecedores do seu sector público, que aumente o IVA na Madeira, pelo menos para níveis idênticos aos que vigoram no continente. E se quiser propor um referendo na Madeira sobre a independência da região, estarei entre aqueles que aplaudirão a sua iniciativa.

Creio que os madeirenses não partilham desse sentimento separatista que Jardim sempre teve dificuldade em ocultar, e que apenas volta a revelar agora, por desespero. Mas, se o referendo for nacional, temo bem que o voto favorável à independência, que não é a minha escolha, venha a ser maior no continente do que na Região Autónoma da Madeira, porque os continentais, que Jardim apouca, estão fartos de carnavais.

Gosto muito da Madeira, acho piada a Jardim, não me aflijo com as suas bravatas, reconheço o que fez no passado para contrariar o centralismo de Lisboa, mas tenho dúvidas sobre muitas das suas obras, que retiraram à Madeira algumas das características únicas e levaram à estagnação do turismo, e tenho a certeza que o monstro que criou, com sector público exagerado à custa de uma subsidiodependência cada vez maior, é um espectáculo caro e um luxo insustentável para um país como o nosso.

A sua eternização no poder resulta das contradições do estatuto autonómico, na medida em que os grandes contribuintes para as suas políticas não votam, sendo natural que os beneficiários locais o apoiem enquanto acreditarem que a sua fórmula é eficiente.

Lamento, também, que Jardim tenha contribuído, assim, com o seu estilo e com os seus exageros, para dar argumentos aos centralistas, criando um monstro cuja incontinência ajudou a enterrar a regionalização.

|JN|
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