Um Estado assente num edifício administrativo do séc. XIX

Num momento em que todos sentimos as dificuldades de estarmos a passar por uma das maiores crises das nossas vidas, precisamos abordar de forma aprofundada alguns assuntos, que apesar de até há bem pouco tempo não serem considerados prioridades, por força das dificuldades subiram rapidamente para o topo delas.

Hoje fala-se e escreve-se muito sobre a dimensão do Estado e sobre o seu papel. Esgrimem-se publicamente argumentos diversos e até contrários acerca das duas dimensões, com uns a defenderem um Estado maior e outros a querem reduzi-lo por considerarem mais marginal o papel que lhe querem atribuir. Mas todos confluem num diagnóstico, tal como está o Estado não é sustentável.

Não o querer discutir para que o possamos redesenhar é ser-se irresponsável por se querer esconder um problema que já existe, porque o Estado já não tem recursos financeiros para cumprir as suas tarefas mais básicas. É necessário então saber-se que Estado se quer e qual a dimensão que deve ter para que possa cumprir essas funções que se lhe pretendem incumbir.

Devemos dotar dos meios necessários o Estado para que este possa assegurar um Sistema de Ensino Público, permitindo a todos os cidadãos o aceso à igualdade de oportunidades para o seu desenvolvimento integral; para que este possa assegurar um Sistema Nacional de Saúde público, garantindo que os cuidados de saúde são universais e independentes da capacidade financeira dos cidadãos; para que este possa gerir um Sistema de Segurança Social público que garanta uma protecção social aos mais carenciados, aos cidadãos que por motivos inesperados se vejam em situações de desemprego, ou que garanta uma sustentabilidade digna aos cidadãos que pela idade se reformaram após toda uma carreira profissional contributiva para esse mesmo sistema.

Este Estado não pode continuar assente num edifício administrativo desenhado sob as premissas do Séc XIX. Devemos acabar o mais imediatamente possível com os distritos e devemos instituir rapidamente as cinco regiões no continente. É uma decisão que cabe tomar sem quaisquer adiamentos e sem ‘referendos’. Se na Constituição portuguesa existe a ‘obrigação’ de referendar este assunto, então que uma maioria de 2/3 dos deputados na Assembleia da República votem a alteração da Constituição, retirando-lhe essa ‘obrigação constitucional’.

Uma regionalização que absorva as actuais administrações descentralizadas do Estado, garantindo a sua melhor coordenação num âmbito regional, reduzindo os meios humanos e os recursos materiais que lhes estão afectas e sobretudo agilizando decisões, tornando-as mais rápidas e mais correctas.

Uma regionalização que torne mais transparente a acção do Estado, por tornar as decisões mais próximas dos cidadãos, e por também permitir que o Estado regional seja alvo de avaliação e escrutínio no fim de cada ciclo de quatro anos.

Avançar para a fusão de algumas autarquias, sejam elas juntas de freguesias sejam elas câmaras municipais, mas apenas no litoral do continente português, também iriam assegurar a simplificação da administração pública. Entre outras, estas duas medidas permitiriam reduzir bastante o edifício administrativo do Estado permitindo-lhe focar-se no papel essencial que lhe deve caber.

|Rui Saraiva|
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