À imagem do Norte

Por Ricardo Arroja - Vida Económica

Esta semana, o Eurostat publicou os dados referentes ao PIB per capita das regiões portuguesas, por comparação com o PIB per capita médio da União Europeia. O retrato é desolador, mas os números (relativos a 2009) não surpreendem.

Pelo contrário, até evidenciam uma ligeira melhoria face a leituras passadas. Mas, então, segundo o Eurostat, a riqueza média por habitante em Portugal representava em 2009 apenas 80% da riqueza média da União Europeia.

Contudo, aquela leitura média escondia também assimetrias acentuadíssimas no seio do território nacional, colocando Portugal entre os países regionalmente mais assimétricos da Europa.

Além disso, evidenciava, aparentemente de forma contraditória, que eram as regiões mais pobres do País aquelas que, precisamente, mais puxavam, no sentido positivo, por esse mesmo País.

Comecemos, então, pelos dados do PIB per capita. A região Norte permanece no lugar da região mais pobre do País, com um PIB per capita de apenas 64% da média europeia.

Seguem-se, por ordem crescente de riqueza média, o Centro (67%), o Alentejo (72%), os Açores (75%), o Algarve (85%), a Madeira (105%) e Lisboa (112%).

Ou seja, das sete regiões de Portugal apenas duas registam um PIB per capita superior à média europeia, sendo que em Lisboa a riqueza média por habitante é quase o dobro daquela que existe na região Norte (definido como acima do rio Douro, até às fronteiras com Espanha).

Enfim, nada que surpreenda aqueles que entram no comboio na estação de Campanhã e que saem na estação do Oriente...

Agora, será que as regiões de Lisboa e da Madeira (que também apresenta uma leitura acima da média europeia) geram a riqueza que os seus indicadores per capita sugerem? A resposta é muito clara e, infelizmente, resume-se a um rotundo e convicto "Não". E porquê? Porque, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (dados referentes ao final do ano de 2010, os últimos disponíveis), a região de Lisboa era a mais deficitária, a larga distância de todas as outras, na balança de bens, acumulando um saldo negativo de vinte e um mil milhões de euros - cerca de 30% do seu PIB regional!

E a Madeira aparecia em terceiro lugar, logo depois do Algarve, com um défice na balança de bens de oitenta e um milhões, ou seja, um saldo negativo (1,5% do PIB), ainda que bem distante do desvario lisboeta.

Pelo contrário, as regiões Norte e Centro acumulavam os maiores excedentes externos nos domínios dos bens, atingindo saldos positivos de dois mil e trezentos milhões e de mil e quatrocentos milhões de euros, respectivamente, em ambos os casos cerca de 5% dos PIB's regionais.

Ora, dos números anteriores resulta claro que o País, além de assimétrico, está centrado na capital, provavelmente, porque é lá que o sector dos não transaccionáveis atinge o seu esplendor. E nem mesmo imputando à capital todo o excedente que o País apresenta na balança de serviços, nem mesmo assim, se transformaria o défice corrente de Lisboa num excedente corrente.

Enfim, num momento que se diz de enfoque estratégico no sector dos transaccionáveis, tudo isto representa uma formidável contradição. Mas, regressando ao tema central deste artigo, dos números anteriores pode-se inferir que, a fim de eliminar o défice corrente de Portugal, as regiões mais ricas teriam de convergir para os patamares de riqueza relativa da região Norte, a região mais competitiva de Portugal na cena internacional.

Agora, será isso possível? A resposta à interrogação anterior é uma incógnita. Por um lado, o ajustamento realizado nas regiões Norte e Centro tem-se feito sem revoluções, apesar do desemprego e da pobreza relativa face ao resto do País. Por outro lado, representa um ajustamento, essencialmente, realizado pela via nominal, ou seja, através de uma desvalorização salarial que, com franqueza, vejo difícil de replicar, sobretudo na majestática Lisboa! Em suma, um País à imagem do Norte? Sinceramente, duvido.
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Comentários

Fronteiras disse…
Muito interessante, mas eu diria mais ainda relativamente a isto e talvez deva fazer uma entrada a respeito disso.

Luís Seixas.