Imagine
uma situação de cerco a um país hostil. Que métodos usar? Desde logo limitar a
circulação nas estradas. Colocar portagens caras é uma forma de o fazer.
Depois, retirar serviços de saúde de proximidade. Fechar escolas.
Em
simultâneo, extinguir ligações ferroviárias sem cuidar de alternativas. Cortar
na segurança pública, deixando a terra à mercê do vandalismo mais fácil -
contra os velhos. Por fim, afastar os tribunais até um ponto onde
economicamente se torne impossível usá-los. Pois, já está. Declaramos guerra ao
Interior há muito tempo. O fecho dos tribunais é apenas mais uma bomba neste
processo de destruição civilizacional.
E
agora olhemos a guerra económica que lhe está subjacente à lupa: quem gera os
brutais défices de Estado? Essencialmente o Litoral. Com as ruinosas empresas
públicas de transporte cuja necessidade nunca foi questionada; com a Parque
Escolar que obviamente recuperou muito mais escolas nas grandes cidades do que
no resto do país; com o milionário programa Polis para melhorar o Litoral; com
as brutais infraestruturas que despejamos neste ciclo infernal "grandes
áreas metropolitanas que precisam sempre de mais hospitais-tribunais-serviços
públicos". Além disso: onde está o emprego público? Em Lisboa, essencialmente,
como capital que é, e depois nas capitais de distrito.
A
"província", como se sabe, tem a obrigação de pôr os campos a
produzir, não sujar a água, gerir a floresta... Atividades nada 'in', de muita
labuta e pouco dinheiro. Depois, a traição: onde plantam os eucaliptos as
empresas de celuloses? No Interior. A seguir levam a matéria-prima para as
fábricas e sacam o valor acrescentado nas holdings da capital em Lisboa (ou na
Holanda) pagando lá os impostos, deixando côdeas "nas aldeias". O Interior
fica a combater as chamas e a entregar quase de graça aos madeireiros as
monoculturas que geram rendimento de 10 em 10 anos...
O
mesmo se passa com a água, o vento ou a energia. A EDP quer tanto saber das
populações de Trás-os-Montes quanto a Three Gorges dos milhões de desalojados
do centro da China. Eles veem contas, não veem equilíbrio nem futuro. O que
resta dos rios livres do Douro - Sabor e Tua? Nada. Pagam amendoins aos locais,
oferecem o carro para apoio social e adeus. Velhotes que pescavam? Pastores de
cabras? Espécies ameaçadas? Para rir - na sede lisboeta ou em Nova Iorque, onde
se atribui o título de empresa mais sustentável do Mundo à EDP... Para esta
gente "desenvolvimento sustentável" é fazer "centros de
interpretação ambiental" onde se 'explica' aos pequeninos, através de
desenhos e fotografias, o que eram as paisagens e as espécies que a habitavam.
Fica aquela paisagem lunar em redor de barragens supérfluas, sem ninguém a
habitá-las, sem turismo de qualidade, sem memória. Tudo muito "sustentável".
Na fatura citadina dos consumidores.
O
nosso Interior pobre não é a Grécia, é uma Albânia sem nome. Não é todo igual,
mas é essencialmente constituído por gente pobre e resignada carregada de
trabalho a um nível que nós, as gerações da cidade e dos serviços, nunca
saberemos o que é, nem de perto nem de longe. Os Açores e a Madeira são regiões
ultraperiféricas carregadas de subsídios (e muitos deles necessários). O nosso
Interior não é ultraperiférico: é uma não-terra com velhos ou teimosos em
oficial mas irreconhecida pobreza per capita.
E
no entanto sinto que este Interior é o meu interior. Foi ali que se fixou a
alma portuguesa contra o avanço espanhol e é essa pertença que delimita a
fronteira há quase 900 anos. Mas hoje eles já não são portugueses - são pobres
sem nação e não valem nada porque são poucos. Os transportes públicos, os
centros de saúde ou as freguesias são o que as pessoas têm do Estado - coisas
que não podem ter apenas pelas suas mãos. E agora, mais esta coisa de... perder
o tribunal. Incompreensível para gente de bem.
Um
dia a Europa far-nos-á o mesmo se não afirmarmos os nossos direitos. Para se
compreender melhor: e, se daqui a uns anos, Bruxelas nos tirasse o Supremo
Tribunal de Lisboa, porque é obviamente mais barato extingui-lo e decidir tudo
num Tribunal Europeu? Nessa altura era a soberania nacional em causa... E agora
não é?
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Comentários
Rui
Um abraco regionalista deste dalgodrense inconformado!
O futuro, por definição ainda não existe. Por isso o futuro não se pode descobrir, mas podemos e devemos ajudar e contribuir para a sua construção . Todos temos que ser ativos em defesa desta parte do território português.
A indiferença mata
Digam-me cá meus senhores: O interior-à sacholada; O Interior à pedrada; O Interior à catanada! etc. e tal também não ficaria mal, principalmente para os jovens lerem ! que acham !? contrutivo hmmm !? Parabéns ao autor deste artigo, pelo seu exemplo civico, cidadania, liberdade de expressão, etc !!!! Eu gostaria de dizer o m nome e também o m mail, mas, c bombas não se brinca. Por isso parabéns muitosd parabéns.
JJkkFDXXKKK!?TTl
Se o interior não tem mais, a si o deve...O mair defeito do interior é as suas populações estarem profundamente divididas por politiquices primitivas...
oKKlZXZFRK
O autor do artº. acima, demonstra não ter um conhecimento minimo do q seja a realidade do nosso País/ interior.Este texto é indigno de figurar neste blog e, fica muito mal uma pessoa falar daquilo que não sabe. É claro q, o facto de uma humilde vilazinha rural do "interior" ter (de seus naturais): juizes, médicos, advogados, arquitectos,generais, procuradores,professores, escritores,Presidente da AR, aos "molhos" !!! faz comixão, frustração e admiração a certas pessoas!
Cumprts, Francisco