Ainda a Casa do Douro

Nos últimos dias, pela chegada do meio século, recebemos um conjunto interessante de “botelhas” de vinho fino do Douro. A maior parte dessas garrafas não tem rótulo, ou as que ainda o conservam limitam-se à indicação do ano ou da colheita.

Esta nossa relação de portugueses com o “vinho do porto” vai para além do valor mercantil do seu conteúdo, tem um simbolismo que só à verdadeira arte se pode comparar. E esta é uma relação que tarda em ser feita, e importa que seja feita.

A Casa do Douro tem uma parte dos seus vinhos hipotecada em várias frentes. A maior das frentes é a que depende do Tesouro Português, que lhe atribuiu um valor e a colocou na dependência “técnica” do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto. Esta circunstância administrativa é nefasta para o Douro e para a sua Casa. E porquê?

Os vinhos da Casa do Douro não devem ser vinhos em comércio normal. Como um quadro de Picasso ou de Rembrandt, quem os tem conserva-os, ou quando alguém os quer vender os preços sobem em leilão da Christie’s.

Ora, o Estado Português é proprietário de uma imensa coleção de arte, espalhada pelos seus museus e serviços, e essa coleção tem um valor incalculável, tem o valor de não ter que ser vendida.

O que a direção da Casa do Douro, o Instituto do Vinho do Porto e o Ministério das Finanças deveriam fazer deveria ser, pois, a atribuição de um valor ao vinho fino do Douro em hipoteca que somasse o valor comercial ao valor simbólico dos diversos anos e colheitas e à história associada.

Estamos completamente certos de que esse valor será sempre muito superior ao que resulta das obrigações que a Casa do Douro tem para com os seus financiadores, fornecedores e, principalmente, para com os seus funcionários.

E como deveria ser contabilizado esse vinho? Como património não alienável do Estado, na dependência do IVDP, gerido de forma a poder prolongar-se no tempo e a poder ser memória viva e prestigiada do Estado Português.

Aproximando-se a eleição da nova direção da Casa do Douro, havendo necessidade de se voltar a por na ordem do dia o problema da sustentabilidade desta instituição, só uma solução como a que propomos pode salvar a situação. E talvez tenhamos um ponto de partida para uma negociação que sempre dependerá do entendimento que o Ministério das Finanças tiver do valor do património vinícola do último século. Façamo-lo entender que o Vinho do Porto não é só o dos rótulos suspeitos colocados em fila nas linhas de venda de qualquer grande superfície…

® 2013.05.04 – Ascenso Simões

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