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Muitas vezes me enganei nos meus critérios de validade política.
Em instinto primário quase reflexo rejeitei homens como Ramalho Eanes e Lucas
Pires, vindo mais tarde a elevá-los como políticos de eleição para quem honra e
verdade eram compagináveis com a política quotidiana. Com Sá Carneiro, só após
a sua morte, é que consegui decifrar a sua elevada estatura de homem livre e
político com desígnio.
Em relação a Mário Soares e Alberto João Jardim nunca me enganei.
Coloquei-os, desde cedo, no índex das minhas mais profundas rejeições. Por
alguma razão especial? Poderia elencar miríades de atos políticos
personificados por estes dois personagens que afetaram a minha forma de
conceber a política, mas não é por aí que eu vou.
Todos, uns mais outros menos, quando chegam ao poder, em algum
momento falham ou hão de falhar na assunção das suas responsabilidades
políticas. Não é pelos seus erros políticos que me abespinho contra os que nos
têm governado, embora alguns, como o iluminado da Madeira, raramente acertem
nas decisões políticas.
O aspeto que mais me toca tem a ver com o foro psicológico. É para
mim inaceitável que alguns se julguem dotados de um especial dom de governação
que os torna excecionais. Sem eles a Pátria em geral e a coisa pública em
particular fenecem num caos desordenado. Esses políticos, possuidores de um ego
maior que a dívida pública portuguesa, têm a ousadia de se julgarem
insubstituíveis ou especialmente dotados para reger o poder. Para estes
pseudoiluminados o poder político é a roupa que vestem à semana e com que vão à
missa ao domingo. Depois de mim o dilúvio dizem eles para quem os quer ouvir
esquecendo-se que o cemitério está cheio de quem se julgava insubstituível.
Mas estes dois diáconos na nossa confraria política têm
hodiernamente os seus seguidores – Luís Filipe Menezes e Fernando Seara. Também
estes dois consideram que a res publica portuguesa não pode prescindir da sua
presciência política, do seu fervoroso empenhamento, da iluminação da sua inteligência.
Menezes e Seara, os illuminatti da atualidade lusitana, julgam-se
suseranos à espera que a plebe os eleja como condutores na luta pela
modernidade política. Estão enganados e não sabem que a luta pela modernidade
política se faz pela elevação cultural de um povo e não através da ação de
condutores iluminados.
Políticos que se eternizam nas redes do poder julgam-se salvadores
da Pátria; não são mais que simples salvadores dos seus interesses imediatos.
Administrar a política como causa própria descamba, não raras vezes, para o
nepotismo e a autocracia encapotada. São raros os homens que encaram a política
como missão patriótica, a vivem plenamente em acertos e desacertos e que
regressam à sua vida anterior como o guerreiro regressa a casa depois de muitas
guerras.
Menezes e Seara fazem parte da força mediática da política. Não
interessa onde estar, querem é estar. Custa-lhes regressar ao anonimato pois,
quais viciados em mediatismo, não conseguem ser felizes sem as luzes da ribalta
a iluminar-lhes os passos.
Não querem abandonar os papéis principais do filme político; não
lhes chega ser figurantes, querem estar na ribalta até ao momento em que a luz
dos holofotes deslacem as maquilhagens com que escondem as suas rugas
políticas.
Não lhes chega a sensação de serviço público que bem ou mal feito
levaram a cabo noutras paragens. Querem perpetuar-se nos palcos da festa mesmo
contra o espírito da lei que tentou prevenir tais desmandos.
Menezes e Seara são dois políticos intelectualmente cabotinos que
necessitam de uma galeria, de um público para manifestarem a grandiosidade da
sua auréola de seres especiais. Pois, só quem se julga especial, não aprende a
inteligir o momento da retirada. Querem morrer em combate como os velhos
guerreiros da antiguidade. Só que o que era sentido de vida para os antigos
Gregos é mera ilusão falaciosa para estes dois atores menores da política
portuguesa.
Menezes e Seara não sabem, nem ninguém lhes disse, que não existem
políticos providenciais tal como não existem homens insubstituíveis. Querem
torpedear a lei porque se julgam únicos servidores válidos da coisa pública.
Colocaram um problema ao tribunal constitucional. Só espero que a
dimensão de dignidade política e elevado serviço público que tem pautado a ação
daquele tribunal se mantenha e impeça estes dois políticos “profissionais” de
ferir uma lei que foi feita exatamente para evitar os vícios inerentes à
eternização no poder daqueles que se julgam fadados para no poder ad eternum se
entronizarem.
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