Barragem de Gouvães - Vila Pouca de Aguiar
Construção da barragem de Gouvães, em Vila Pouca de Aguiar,
vai submergir património nacional e inundar terrenos agrícolas. População
lamenta as perdas e afirma que o empreendimento não traz benefícios.
As águas da albufeira da barragem de Gouvães, uma das três
que integra o empreendimento hidroeléctrico do Alto Tâmega, vão submergir um
complexo de sepulturas megalíticas denominado Chã das Arcas, património
nacional desde 1910.
O conjunto de seis dólmens data de finais do período
neolítico, há cerca de 4.500 anos, e era um dos grandes motivos de atração ao
concelho de Vila Pouca de Aguiar, que ganhou no séc. XIX o epíteto “Pátria dos
Dólmens”.
“Estes monumentos tinham muito relevo para a nossa freguesia
e concelho porque vinham cá muitas pessoas visitá-los. Eram autocarros e
autocarros de pessoas aos fins-de-semana”, refere à Renascença o presidente da
Junta do Alvão, António Guedes.
A Chã da Arcas era “um dos conjuntos de mamoas melhor
preservados”, explica Patrícia Machado, arqueóloga da autarquia aguieirense,
realçando o seu valor patrimonial e a sua importância para o turismo do
concelho, na medida em que “numa pequena área conseguia combinar as duas
tipologias de mamoas conhecidas na Península Ibérica, as mamoas simples e as de
corredor”.
Os monumentos já foram selados, podendo-se observar agora no
local apenas umas pequenas colinas de terra. Antes foram alvo de escavações e
de investigação, no âmbito do projecto das barragens.
O presidente da Câmara de Vila Pouca de Aguiar, Alberto
Machado, garante que, como medida de compensação pela perda da Chã das Arcas,
“vão ser feitos investimentos significativos no concelho”, nomeadamente “no
complexo mineiro romano de Tresminas”.
Projecto sem “regalias”
Inconformado com a construção do empreendimento hidroeléctrico, o autarca da Freguesia do Alvão acrescenta à perda do património outras queixas, pois, segundo António Guedes, “é uma grande área que vai ficar submersa por um lago e que não vai trazer regalias”.
“Vamos perder os melhores terrenos agrícolas e de pastagens.
Vamos sofrer com as alterações climáticas, como o aumento dos dias de nevoeiro
e frio, e não vamos tirar dividendos da barragem, que será reversível, logo com
uma grande oscilação dos níveis de água", impedindo o seu aproveitamento
turístico ou para regadio, frisa António Guedes, explicando que “não se pode
tomar banho, não se pode andar de canoa, não se pode pescar, não se pode
regar…”
“Passarinho que nasce na terra fria sempre por ela pia”
Palavras retratarem o sentimento de perda de Maria Escaleira, ao olhar para a casa onde nasceu e cresceu com os sete irmãos, e que vai ficar submersa pelas águas da barragem de Gouvães, no concelho de Vila Pouca de Aguiar.
Maria compreende que o empreendimento “até pode fazer
falta”, mas não cala a dor que sente ao “pensar que tudo vai abaixo”. “Nasci e
cresci aqui, com os meus irmãos, e cá no fundo dói. Dói no coração saber que
vamos perder tudo isto”, lamenta à Renascença.
Também para os pescadores habituados às águas límpidas e aos
peixes do rio Torno, saber que ali vai ser edificada uma barragem, é motivo de
grande tristeza.
António Fernandes não quer pensar que dentro de pouco tempo
não vai poder estar naquele local. “A barragem vai estragar tudo. As águas vão
ficar paradas e o peixe vai saber ao lodo.”
Obras vão começar
Em Janeiro, os municípios do Alto Tâmega acordaram com a
espanhola Iberdrola um plano de acção de 50 milhões de euros para investimentos
e compensações resultantes da construção das três barragens.
O processo do empreendimento hidroeléctrico, que inclui as
barragens de Gouvães, Tâmega e Daivões, tem-se arrastado e os ambientalistas
interpuseram uma providência cautelar para considerar nula a Declaração de
Impacte Ambiental (DIA).
Alberto Machado, presidente da autarquia de Vila Pouca de
Aguiar, confirma ter a indicação de que, nas próximas semanas, será assinado o
contrato de concessão entre o Governo e a Iberdrola, possibilitando o início da
obra.
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