A organização do território

A variável errada.

A organização de qualquer território é uma equação complexa. Que, por sua vez, é importante para lidar com os desafios da competitividade económica e da coesão de uma sociedade.

Em Portugal, como sucede noutros campos das políticas públicas, a arquitetura do território foi sendo construída em momentos e contextos muito diferentes. É uma longa história de projetos interrompidos e de pressões contraditórias que resultaram numa manta de retalhos que pouco favorece quer a eficácia territorial quer a sua democraticidade.

Sem recuar muito no tempo, considere-se o caso das regiões administrativas. Apesar de estarem na Constituição desde 1976, nunca passaram à prática. Em 1991, as 5 regiões-quadro, sem órgãos eleitos e na origem das atuais CCDR, passaram a ser a referência para muitas políticas públicas (na saúde e educação, ou para os apoios europeus), mas noutros casos (como a segurança social) os distritos continuaram a servir como base. Em 1998 o mapa de 8 regiões chumbado em referendo (que passara a ser exigência constitucional) não coincidia com as regiões-quadro em vigor.

Elas próprias nasceram, aliás, com contradições. Num caso, criaram uma região a partir de um pólo metropolitano (Lisboa e Vale do Tejo), noutro assimilam o Porto a todo o Norte. Por outro lado, co-existem as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, a partir de uma tentativa do governo PSD/CDS em 2003 de alternativa à regionalização mediante associação voluntarista de municípios.

Perante os impasses da regionalização, a descentralização com base nas autarquias avançou timidamente, e não sem equívocos. A transferência de competências conheceu avanços e recuos e nem sempre foi acompanhada de financiamento adequado, tendência que se agravou no atual contexto de austeridade. A exiguidade de competências e a dependência em relação ao Estado central mantêm-se, aliás, como um entrave à subsidiariedade entre poder central e descentralizado.

A despesa municipal é, em Portugal, 14,7% da despesa pública (contra 53,4 em Espanha ou 40,6 em França). E a percentagem de impostos usados pelo poder local no volume total não ultrapassa os 9,9%, valor que compara com 54,4% em Espanha ou 34,2 em França. 

Diminuir o número de freguesias (ou de municípios) a régua e esquadro mexe em linhas divisórias mas não tem impacto financeiro significativo. Nem melhora o padrão de desenvolvimento territorial, pelo contrário: enfraquece a gestão de proximidade e, também, os mecanismos identitários e a democracia local, seja nas áreas rurais, seja nas áreas urbanas.

Nesta equação, fundamental é mexer noutras variáveis. Precisamos de um nível intermédio de poder territorial com mais competências e com legitimidade democrática. E de aprofundar as competências e a autonomia dos municípios, libertando-os da dependência face ao poder central. Não são dois caminhos alternativos, é um só.
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MiguelCabrita, Sociólogo

Comentários

Al Cardoso disse…
Pois claro que precisamos uma verdadeira regionalizacao e, ja ha muito tempo!
Fernando Romano disse…
O que é que se passou no Pontal com o "Remexido" algarvio Mendes Bota, regionalista de fina água, que não falou desta vez em regionalização, optando por abrir caminho para a presidência da câmara de Faro, a cujo actual presidente tem vindo a dar facadas nas costas há muito tempo, e aventa a hipótese ainda de querer ir para o Parlamento Europeu?

Isto é que estão aqui uns regionalistas!!!

Estão a ver que tenho razão. O Menezes de Gaia também vai negociando uma cidade maior, Porto/Gaia, como sede do Império do Norte.

Será que ele não se ajeita no inglês e no francês, e por isso não quer ir para Bruxelas? Ouvi dizer que se sai muito bem no galelo e no castelhano...

Afinal os regionalistas são isto....
claudio disse…
oh amigo aqui defende se regionalizacao. nao regionalistas politicos! acabe la com esses comentarios! ja se sabe que os que se dizem regionalistas sao mais depressa oportunistas. mas uma regionalizacao iria sempre ser democratica e com novos rostos no poder.

sou regionalista e nao sei se votaria sim nas regioes de fossem para cargos de chefia politicos de hoje!
Anónimo disse…
Quando se discute a reginalização associando logo nomes que poderão pertencer aos orgãos regionais , e o que fizeram desde o 25 de Abril foi ocuparem lugares não é defender a regionalização.
Se há lição que a História nos pode dar é de que as mudanças são inevitáveis e é melhor que sejam sensatas para proveito dos que nela vão ter que viver. Regionalização sim , mas sem interesses de ocupação de mais tachos , mas para um desenvolvimento sustentado